Ocupações, Chelas, 1974
Fotografia de Carlos Gil (1937-2001)
© Arquivo Municipal de Lisboa
“Que a imaginação se manifeste, não o imaginário que permite a fuga e a evasão, que veicula ideologias, mas o imaginário que investe na apropriação (do tempo, do espaço, da vida psicológica, do desejo). Porque não opor à cidade eterna as cidades efémeras e as centralidades móveis aos centros estáveis? Todas as audácias são permitidas. E porquê limitar estas propostas à mera morfologia do espaço e do tempo? Não é de excluir que neste plano surjam também propostas relativas ao estilo de vida, ao modo de viver na cidade, ao desenvolvimento do urbano. (…)
A sociedade em que vivemos parece virada para a plenitude, ou, pelo menos, para o pleno (objectos e bens duráveis, quantidade, satisfação, racionalidade). Mas, na realidade, ela escava um vazio colossal; neste vazio agitam-se as ideologias, expande-se a bruma das retóricas. Um dos maiores desígnios a que o pensamento activo se pode propor, a partir da saída da especulação e da contemplação, dos seccionamentos fragmentários e dos conhecimentos parcelares, consiste em preencher esta lacuna, e isso não se faz apenas com a linguagem.
Num período em que as ideologias discorrem abundantemente sobre as estruturas, a desestruturação da cidade manifesta a profundidade dos fenómenos de desintegração (social e cultural). Esta sociedade, globalmente considerada, descobre-se como lacunar. Entre os subsistemas e as estruturas consolidadas por diversos meios (constrangimentos, terror, persuasão ideológica) existem buracos, por vezes abismos. Estes vazios não surgem por acaso. São também os lugares do possível. Eles contêm os elementos, flutuantes ou dispersos, mas não a força capaz de os reunir. Além disso, as acções estruturantes e o poder do vazio social tendem a impedir a acção e até a simples presença de uma tal força. As instâncias do possível só se podem realizar no decurso de uma metamorfose radical.”
Henri Lefebvre, O Direito à Cidade (tradução de Rui Lopo, edição Letra Livre)
“O filme amador não é simplesmente um objeto fetiche que reenvia para múltiplos traumas psicanalíticos (ainda que, se perscrutarmos as imagens, elas possam revelar muitas coisas...), nem um artefato cultural, mas um processo cultural, caracterizado pela sua instabilidade, as suas contradições e a multiplicidade das suas camadas de conhecimento e história. Eu poderia caraterizá-lo como uma forma ligeira de história, em constante revisão dos seus objetivos e das suas pretensões (visées) democráticas. É nesta ligeireza que reside a esperança. Os problemas (filosóficos e ontológicos) provocados por esta ligeireza, são as razões pelas quais se consideram as produções amadoras, um fator central no acesso às comunicações na nova ordem mundial. Como defendeu a mesa redonda da [Comissão] MacBride [International Commission for the Study of Communication Problems], o direito à comunicação é um direito humano fundamental que deve ser protegido e desenvolvido por todo o mundo. Sem tecnologias acessíveis e baratas, como a dos filmes e os vídeos amadores, a democracia ficaria refém para sempre do capitalismo do consumo ocidental. “
Patricia R. Zimmermann, Cinéma amateur et démocratie, Communications nr.68 (1999)
Methods of occupation (a term for transforming space to suit ones needs)
by superimposition
by envelopment
by consumption
by digestion*
Gordon Matta-Clark
*Métodos de ocupação (um termo para transformar o espaço de modo a atender às nossas necessidades):por sobre imposição, por envolvimento, por consumo, por digestão.