Swagatam, Catarina Alves Costa, 1998
... este meu filme, que já tem 20 anos, foi filmado num território que na altura se chamava o bairro da Quinta da Holandesa, ali por trás dos cinemas Alfa, no Areeiro: há ali duas torres, por trás há um vale, e existia ali um bairro. Foi lá que eu filmei em 1998 o Swagatam, que quer dizer “Bem-vindos” e é o nome do programa de rádio que o Senhor Champaklal faz há mais de 20 anos, um programa dirigido às populações islâmicas e hindus da cidade de Lisboa que ainda hoje existe, aos domingos de manhã, na rádio Orbital. Um dia, no carro, ouvi por acaso este programa de rádio e quis saber o que estava por trás dele e foi assim que cheguei ao bairro.
Ali, o que vemos é uma civilização milenar, trazida pelos hindus que vêm habitar o bairro, e um espaço e uma habitação precária e recente. As pessoas que viviam nesse bairro foram realojadas no bairro do Armador, aqui em Marvila (...) e mesmo agora, no bairro do Armador, um bairro que tem 20 anos, as pessoas vivem num tempo longo.
Só uma imagem, para vos dar conta do que estou a dizer: a avó da família Carsane – à esquerda na fotografia, aquela senhora que está de branco – quis trazer a sua mó de pedra, onde ela fazia a farinha de arroz. A sua mó de pedra veio de Moçambique num navio, chegou dois anos depois, foi instalada no pátio da casa e uma das cenas do filme é a avó a moer o arroz na sua mó de pedra que pertencia à sua avó. Essa mó de pedra vive noutra dimensão temporal daquela que é a da casa que eles habitam.
Hoje em dia o que nós encontramos no local onde existia o bairro, é isto: um parque de estacionamento, ali por trás das torres, um terreno mais ou menos vago atravessado pela linha do comboio.
Fragmentos da intervenção de Catarina Alves Costa no Laboratório Cidade/Arquivo (ciclo “O que é o Arquivo?”) organizado em Maio de 2019 na Biblioteca de Marvila.